segunda-feira, 15 de junho de 2009

depoimentos de pessoas que já passaram por esta experiência ou situações parecidas;

Os dados foram agrupados em categorias, considerando as motivações, as similaridades e as divergências, tomando como base os depoimentos dos adolescentes.

Na categoria Contextualizando a percepção sobre ser pai/mãe adolescente as falas dos sujeitos mostram uma certa estranheza, um encantamento, surpresa e a satisfação em relação ao nascimento de seus primeiros filhos.

Eu adorei! Adorei porque eu já estava planejando, já estava tendo um relacionamento com ele. Eu namorava ele desde os 12 anos e a gente já estava morando junto (Água-marinha).

Quando nasceu (o primeiro) foi uma surpresa... você vê a criança, assim, lá no berçário... é uma coisa inexplicável, né? O meu coração acelerou, as lágrimas caíram, é uma emoção, fora do comum (Topázio).

As vivências e transformações dos adolescentes são individuais, devendo ser compreendidas dentro de seu próprio mundo vida, na sua atitude natural, de acordo com sua situação biográfica e não em um conceito cronobiomédico, de maneira massificada como ocorre com grande parte do conhecimento científico atual sobre a progenitura adolescente.

Ainda que a realidade social padronize toda ação social, cada indivíduo situa-se no mundo da vida de maneira própria, sendo esta sua situação biográfica.7

Parece haver uma busca de estabilidade revelada por meio da percepção do filho como algo próprio, um bem. Isto pode revelar uma tentativa de obter autonomia, atingir a maturidade e perceber sua própria competência para cuidar do filho.

[...] Eu gostei, eu me senti bem! [...] Eu não sabia dar de mamar, dar banho, trocar... mas aprendi (Ágata).

Em outros discursos, a percepção perpassa por estranhamento, por surpresa, por dificuldade com a experiência e até por sentimentos de raiva e solidão:

O amor parental, como qualquer forma de amor, é algo construído. Sendo assim nem todos os homens ou todas mulheres sentem de imediato o amor que se espera deles. Então, como esperar esse sentimento de indivíduos em formação de uma identidade, ainda sem um completo estabelecimento de valores pessoais, sobretudo, quando a maternidade e ou paternidade não foram planejadas?

O primeiro eu achei estranho. Assim, depois me acostumei. Mas nós programamos ele, não teve problema nenhum. [...] Primeiro, eu achei estranho, depois me acostumei, é bom... não acho ruim, não ruim. Acho que sou bom pai, é... eu ajudo a cuidar dele... trocar, dar banho... (Jacinto).

Nesta visão, a figura da mãe, sobretudo da mãe das adolescentes, revela-se como a mais importante referência aos jovens na transmissão de conhecimentos à próxima geração. A gravidez e a maternidade precoce da mãe da adolescente prenunciam uma forte influência intergeracional no padrão sexual e reprodutivo dos filhos, sobretudo, no gênero feminino.

Este tipo de ambiente promove a repetição do ciclo gravidez-parentalidade repetida. Percebemos esta influência nos trechos de discursos de alguns adolescentes que também tiveram mãe e ou pai que foram pais adolescentes, como serão apresentados, a seguir.

Não posso falar que é muito cedo, minha irmã teve o filho dela aos 14 anos e, pra ela, foi bom! (Pepita).

[...] minha mãe também casou cedo, com 12, com 13 teve minha irmã e com 14 eu nasci. ... Pra mim, não tem nada a ver a idade se a pessoa se gosta se assume o filho, não tem diferença (Jacinto).

Meus pais tiveram muitos filhos, cinco, e cedo (a mãe teve o primeiro aos 17 anos) (Topázio).

As experiências acumuladas auxiliam no projeto de ação relacionado ao presente vivido. Desse modo, as pessoas podem orientar-se no mundo da vida, utilizando estas experiências para criar códigos de interpretação de vivências passadas e presentes.7

Diante da parentalidade e de sua repetição os adolescentes vão elaborando as mudanças, realizando adaptações que acreditam ser necessárias e a partir do segundo nascimento não há grande estranhamento ou surpresa com o nascimento dos filhos.

Acho que vou dar conta das duas. Não vai dar problema, pode dar ciúmes. No começo da gravidez, eu queria tirar. Ai!, eu queria tirarrr! Aí, ele brigou comigo... Agora, tá tudo bem! (Água-marinha).

Não foi planejado, mas está diferente do primeiro porque tenho mais experiência. Está bom! (Esmeralda).

Esse aqui não foi planejado. Eu parei de tomar remédio, tava descansando, tava usando camisinha, mas queria mais um, mais cedo ou mais tarde (Ágata).

Ah! Eu me assustei um pouco, ele não foi programado, então, no começo fiquei meio assim. Depois você vai acostumando, acostumando e, se tiver uma educação como o outro, vai ser normal... vai educar a mesma coisa, vai dar a mesma educação do outro (Crisólito).

Na categoria Vivenciando perdas percebemos que a parentalidade exigiu dos jovens a assunção de novas responsabilidades, o que demandou a diminuição de participação em atividades de lazer e recreação. Interromper os estudos antes do planejado ou impossibilitar sua continuidade e para alguns rapazes a busca de algum trabalho.

O nascimento dos filhos, impediu os adolescentes de um convívio social mais intenso como antes, restringindo-os ao ambiente familiar. Passaram de uma vida social ativa tão necessária a estes jovens que estão buscando a construção de uma identidade adulta, para uma vida caseira, como passamos a apresentar.

[...] Hoje, tenho que trabalhar. Não posso ficar com eles (os filhos) porque onde trabalho é longe (em tempo integral). Então, eu passo minha responsabilidade toda para o pai deles, por algum tempo, né? (Jaspe).

[...] (no primeiro) não sabia cuidar de criança, cuidava na marra, né? (Safira).

Eu não era de sair, mas agora com os filhos fica difícil, né? (Jade).

[...] a liberdade é o pior, não poder sair, não poder fazer quase nada... (Esmeralda).

Na categoria Vivenciando ganhos os relatos mostram que para muitos a parentalidade representa, também, lucros. A experiência dos ganhos está relacionada ao amadurecimento, à responsabilidade, à satisfação advindos do exercício parental e à satisfação pessoal de realizar-se como mulher/ mãe, homem/pai.

É bom porque a gente pode cuidar melhor, pode dar mais atenção ... porque a gente pode acompanhar o crescimento ... a gente é mais nova, tem mais tempo ... não trabalha (Esmeralda).

Eu acho que, pra mim, foi bom porque eu amadureci mais rápido. Veio uma responsabilidade pra mim. Fiquei mais responsável, tudo que vou fazer, tenho mais consciência por causa dos meus filhos. Acho que a coisa boa pra mim, é que tenho eles e isso ajudou também para mim... para... como vou falar... ficar mais maduro... amadureci mais rápido do que o normal (Diamante).

Pelas falas dos sujeitos, foi possível apreender que a parentalidade parece inserir os adolescentes no mundo adulto. No que se refere aos rapazes, a responsabilidade pelos seus atos demonstra ser um dos atributos de virilidade, que fazem parte do ideário da masculinidade. No entanto, ressalto que se torna difícil para os jovens assumir a paternidade sem os suportes familiares e sociais.

Apoiados nos depoimentos dos sujeitos, depreendemos que nem sempre a experiência parental foi planejada, mesmo assim, esta não foi indesejável. Relatam uma satisfação com o nascimento dos filhos.

Ao refletir sobre a questão da idade dos sujeitos, intuimos que as dificuldades que os jovens enfrentam estão mais associadas à carência econômica, à precariedade de serviços de apoio e/ou da família e aos recursos disponíveis que incrementam as perdas e frustrações no processo paternal, podendo levar a um desempenho parental insatisfatório.

Na categoria Buscando segurança para o futuro percebemos que as dificuldades para projetarem-se estão claramente associadas às condições objetivas de vida, nas quais os adolescentes encontram-se imersos. A magnitude dos problemas enfrentados no cotidiano é vinculada à alimentação, moradia, vestuário, sustento da família etc, em contrapartida com as escassas alternativas para resolvê-los que dificultam a possibilidade de planejar e pensar no futuro, visto que não podem exercer um controle mínimo sobre o que lhes sucede.

O relato sobre os recursos econômicos necessários para criar um filho, assim como sua educação, além do desejo de uma moradia própria foi uma constante nos discursos dos sujeitos deste estudo.

Ter um futuro bom... assim, cuidar deles. Ah! Eu penso assim... dar o melhor pra eles, ensinar o que é certo e errado (Crisólito).

Eu espero que eles peguem firme com o estudo, se formem, não sei. [...] Cada um vai escolher a profissão que vai querer. Eu espero mesmo que todos concluam os estudos, e... Ah! Que fiquem bem! Cada um tenha a sua vida bem firmada, bem estruturada, que siga um caminho certo, seja pessoa honesta, que trabalhe, não desvie, não desande para o lado errado... drogas, roubo, essas coisas, assim... (Diamante).

Tomamos conhecimento que os familiares, com freqüência, assumem um papel relevante no cuidado da criança, permitindo aos adolescentes lidar de forma adequada com o estresse da parentalidade.

[...] minha mãe me ensinou um pouco no começo... cuidando da casa; no momento eu não tô cuidando, tem gente que tá cuidando. Minha mãe paga uma moça para cuidar da casa. Eu acho que sou uma boa mãe, minha mãe acha que só ela é a melhor... só ela que cuida bem dele e, pronto! (Jade).

Trabalho no departamento de vendas de cilindros hidráulicos (com o pai) (Jaspe).

Alguns adolescentes falam do empenho para estabelecer e/ou manter o relacionamento afetivo. Um pai de 17 anos chegou a empregar a expressão lutar para ficar com a segunda companheira, mãe de seu segundo filho.

Acho essencial o pai ficar junto com o filho, entendeu? [...] Só que com a mãe do meu primeiro filho não pude ficar, porque nós não lutamos pra isso. Agora, com esse segundo, eu vou lutar pra ficar junto com ela. Vou ser um pai melhor... lutar pra isso... vou lutar pra ficar mais junto com ele (Ônix).

Chama a atenção o fato de que a união conjugal e/ou assunção da paternidade pode não somente alterar a percepção da gravidez/ maternidade pela adolescente, mas a percepção de toda a família, que passa a ter uma visão mais favorável do evento.

Em relação às conseqüências da parentalidade na vida conjugal de adolescentes observa-se duas situações, uma positiva e outra negativa. Se por um lado, esta uniria o casal, pela decisão de viverem juntos, promovendo o crescimento de ambos e uma relação afetiva positiva, também, com benefícios à(s) criança(s). Por outro lado, o nascimento de um filho e a decisão de morar juntos poderia desfazer o estado de enamoramento anterior, levando esses casais a experimentarem mais problemas conjugais e separações.9

Pretendo casar, mas só quando tiver 18 anos (Jacinto).

[...] mas quando tem família, você pensa, tem que trabalhar direitinho, certo, pra dar um futuro melhor pra eles... ensinar o que é certo e errado (Crisólito).

Causa que, o meu futuro, é o futuro dos meus filhos. Esse está sendo o meu projeto, dar o melhor, ter uma família estruturada. Eu estou botando muita confiança neste meu novo relacionamento (Ônix).

A categoria Expressando situação ambivalente caracteriza a reflexão a respeito do que os adolescentes anelam e a realidade vivida por eles, ou seja, a ambivalência de sentimentos, o desejo de ser pai e/ou mãe em contraste com o fato de muitos não quererem ter mais filhos; a opinião de que ser pai/mãe cedo é bom, entretanto, não aconselha ninguém a tê-los tão cedo; a opinião de que ser pai/mãe é bom, torna-os responsáveis e amadurecidos mas, em contrapartida, tira-lhes a liberdade, a juventude e impede a continuação dos estudos.

[...] Certo ter filho cedo não é, né? [...] mas se vir também tem cuidar igual normal... o filho não tira a liberdade... não tira, se você tiver sentimento, faz a coisa certa... como eu. Pra mim, não tem nada de ruim de ser pai jovem... pra algumas pessoas tem, né? Pra mim, não! Nem pra ela... (Crisólito).

[...] eu gostei de ser mãe, mas foi um trauma no instante que eu soube que estava grávida... foi um susto... a gravidez foi um caos... ficava pensando, um com dois anos... e outro menor ainda e eu ainda estou um pouco assustada. [...] Foi uma experiência muito séria, mas estou achando maravilhoso... estou encantada com eles. Eu aconselho as outras meninas para estudar, construir sua vida primeiro, depois, sim, pensar em construir uma família. Agora, eu não dou conselho a ninguém (Turmalina).

O processo gestacional, como a parentalidade, envolve alterações intrapsíquicas, interpessoais, etc. Pautada na percepção de concepção surge a ambivalência afetiva - a oscilação entre desejo e não desejo da gestação, o querer e não-querer a criança. Não há uma aceitação total ou rejeição total da gravidez, pois o sentimento oposto jamais estará inteiramente ausente.10

De igual modo, a adolescência, por si só, é um momento de conflito, de ambivalência, de sentimentos paradoxais, de crise. É muito mais que uma fase de transformações físicas, portanto, deve ser contemplada como um período existencial de tomada de posição social, familiar, sexual entre o grupo. Entretanto, é na condição de ser adolescente, na realidade social vivida por estes jovens que se encontra o grande diferencial entre parentalidade adolescente e adulta.

Uma coisa de ruim de ter filho cedo é que agora eu não vou poder continuar estudando. Mas uma coisa de bom é que a gente pega experiência de vida e tudo, amadurece bastante, tem responsabilidade (Rubi).

[...] é bom que quando você tiver uns 30 anos, eles já vão estar grandes... quando eu tiver uns 30, o primeiro vai estar com 20 e este vai ter mais ou menos 18 anos. Por outro lado, você perde a sua juventude. Assim... mas é só olhar pra carinha deles... que já basta. Eu acho que... no começo, eu me arrependo ... (Marcassita).

Uma razão para o conflito e ambivalência existencial é que a parentalidade na adolescência contraria os projetos que a sociedade prescreve aos indivíduos: as atividades escolares, a preparação profissional, a aquisição de um trabalho remunerado, o estabelecimento de uma relação amorosa estável, duradoura e, só então, a reprodução dentro dos laços do matrimônio. Quando as situações da vida não ocorrem mais ou menos dentro desta seqüência, podem causar certa dificuldade aos jovens como destacamos.

Depois você quer viver a adolescência que você não viveu, aí, fica tudo bagunçado... (Jaspe).

[...] uma coisa de ruim em ser pai jovem é que você perde muito, muita oportunidade, escola, trabalho... (Ônix).

Percebemos que os adolescentes deste estudo tinham uma relação cuidadosa com suas crianças. Externavam queixas pelas limitações às atividades sociais impostas pela criação dos filhos, entretanto não existiam sentimentos de ambivalência em relação aos filhos e, sim, pelas obrigações conseqüentes da parentalidade. Quanto ao desejo de ter filhos, expresso por eles, este também poderia representar um desejo de independência ou uma fuga e não um verdadeiro amadurecimento psicoemocional e sexual.

Vai ser um pouco mais difícil porque você não tem aquele dinheiro, né? Mas aí, nós dá um jeito. Minha mãe ajuda nós.[...] O segundo vai ser mais fácil, o primeiro a gente já tira de letra... segundo e último! (Crisólito).

Mais uma vez a ambivalência é desvelada na difícil situação vivenciada pelos adolescentes ao lidar com os dois novos papéis sociais, simultaneamente, o de ser adolescente e ser pai/mãe.

A sua vida muda, você não pode fazer as mesmas coisas que fazia. Mas assim, se a pessoa quiser coisa séria, criar uma família, ela tem que ter. Eu não posso falar o que é muito cedo, pois a minha irmã mesmo teve o primeiro filho dela aos 14 anos e, pra ela, também foi bom (Pepita).

Não que me arrependi, mas, se fosse um tempo atrás, eu não teria... perdi bastaaante a liberdade! O bom é que eu tenho eles! Assim, idade ideal pra ter filho, não tem... tem que ter uma situação boa, sua casa... (Jade).

A ambivalência é uma das características da existência do Homem que só se constitui sob laços de tensão, que unem e afastam. Grande parte dos adolescentes tornou-se genitor e genitora recorrentes em uma época de maiores conflitos e ambivalência humana quando estão formando sua identidade e conquistando um lugar na sociedade. Nesse período vital, existe uma ambivalência de se firmar como mulher/mãe e homem/pai.

Na adolescência o desejo de ter um filho traz fortes componentes ligados aos sentimentos ambivalentes frente ao processo de tornar-se independente dos pais. Mais uma vez afirmamos, entre adultos a ambivalência também existe, porém, na adolescência, é intensa e bem marcada pelas transformações próprias do período.11

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